Quando a crise na saúde vira oportunidade de mercado

Em um livro sobre capitalismo comunicacional, um dos textos falava sobre como a crise ambiental, que deveria nos fazer repensar nossas formas de viver, acabou virando uma grande oportunidade de negócios. O medo do fim do mundo foi transformado em produto, e nós, consumidores, fomos colocados como responsáveis por escolher as “empresas corretas” para atenuar nossa culpa.

Enquanto lia, não consegui evitar o paralelo com a crise da saúde, marcada pelo aumento das condições crônicas, pelo cuidado fragmentado e pela sobrecarga dos profissionais. O discurso midiático-mercadológico capturou essa crise e nos oferece soluções embaladas em promessas: suplementos naturais, terapias (nem tão) alternativas, protocolos (nada) exclusivos, aplicativos e produtos que prometem saúde instantânea.

E junto com essas ofertas, vem uma mensagem sutil, mas poderosa: a responsabilidade pela sua saúde é só sua. É preciso fugir da big pharma, se exercitar de tal forma, se alimentar de tal maneira, mas no fundo, caímos na mesma lógica: transformar saúde em mercadoria.

Esse movimento é o que alguns chamam de healthwashing, semelhante ao greenwashing, onde se vende uma ideia de saúde e bem-estar para mascarar práticas que operam sem transformar as causas que adoecem. Não nos convidam a mudar o modo como vivemos, mas a consumir de outro jeito.

Mas será que a lógica do mercado é a única resposta para a saúde? Como Ivan Illich já alertava, transformar saúde em produto não resolve o que adoece. O mercado da saúde pode gerar mais sofrimento do que alívio, ao reduzir o cuidado à lógica do consumo e criar dependência de soluções externas, enquanto esquecemos da potência do cuidado compartilhado e da autonomia.

Sei que não há resposta simples, mas talvez isso seja um convite para refletir sobre o caminho que estamos seguindo e perceber se estamos realmente nos aproximando do cuidado ou apenas alimentando um mercado que lucra com o nosso adoecer.

Ps: O livro era ” Sintoma e Fantasia no Capitalismo Comunicacional” – José Luiz Aidar Prado (2019)